Sem entrar no mérito das discussões econômicas, políticas e sociais, o que diz a legislação de trânsito sobre este tipo de conduta? Entenda!
Desde o início da semana temos acompanhado o bloqueio de rodovias por todo o Brasil como protesto ao resultado das eleições para Presidência da República. Tais manifestações além de causarem inúmeros malefícios ao país como um todo, também provocam problemas para o trânsito e são consideradas infrações de trânsito.
Sem entrar no mérito das discussões econômicas, políticas e sociais, no entanto, o que diz a legislação de trânsito sobre este tipo de conduta? Qual é o órgão fiscalizador? Quais são as penalidades para quem comete esse tipo de delito?
Essas e outras dúvidas foram respondidas com exclusividade ao Portal do Trânsito pela advogada, Rochane Ponzi, moderadora do Grupo de Estudos em Direito de Trânsito da ESA- OAB/RS e Vice-Presidente da Associação Brasileira dos Advogados de Trânsito – ABATRAN.
Acompanhe!
Portal do Trânsito – De modo resumido, o que diz a legislação sobre bloqueio de rodovias brasileiras?
Rochane Ponzi – Em 2016 a Lei 13.281 incluiu no Código de Trânsito Brasileiro o art. 253-A, estabelecendo multa, suspensão do direito de dirigir por 12 meses e remoção do veículo para quem “Usar qualquer veículo para, deliberadamente, interromper, restringir ou perturbar a circulação na via sem autorização do órgão ou entidade de trânsito com circunscrição sobre ela”.
Trata-se de infração que possui a pena pecuniária mais alta prevista no CTB. Isso porque prevê multa gravíssima (R$ 293,47) multiplicada por 20 (vinte) para quem participa e multiplicada por 60 (sessenta) para quem organiza a conduta.
Em caso de reincidência dessa prática em 12 meses (ou seja, basta que a interrupção da rodovia se prolongue por mais de um dia), a multa para cada um deles será em dobro, sem prejuízo da primeira multa aplicada.
Grosso modo, significa dizer que quem bloqueia a rodovia por mais de um dia, por exemplo, pode vir a ser penalizado com suspensão da CNH por 12 meses e duas multas: uma de R$ 5.869,40, seguida de outra no valor de R$ 11.738,80.
Já quem organiza, se for uma pessoa física bem como tiver CNH, além da suspensão por 12 meses, terá que pagar a multa de R$ 17.608,20, mais outra de R$ 35.216,40, quando reincidente.
Portal do Trânsito – Qual é ou quais são os órgãos estabelecidos como responsáveis pela fiscalização das rodovias nos casos de manifestações que paralisem tais vias?
Rochane Ponzi – O órgão responsável pela aplicação desse tipo de penalidade é o órgão com circunscrição sobre a via. Ou seja, se o bloqueio ocorrer em perímetro urbano, geralmente a competência é do município. Se ocorrer em rodovias, vai depender se a rodovia é federal (Polícia Rodoviária Federal) ou estadual (DER, DAER, Polícia Rodoviária Estadual)
Portal do Trânsito – O que de fato pode ser feito pela autoridade responsável, para que os manifestantes desbloqueiem as vias?
Rochane Ponzi – A previsão sobre isso vem estampada no §3º do art. 253-A: “As penalidades são aplicáveis a pessoas físicas ou jurídicas que incorram na infração, devendo a autoridade com circunscrição sobre a via restabelecer de imediato, se possível, as condições de normalidade para a circulação na via.”
Portal do Trânsito – E quanto aos desafios das autoridades, quais são os maiores obstáculos para paralisar as manifestações e desbloquear as rodovias?
Rochane Ponzi – Entendo que o grande desafio é saber identificar a linha limítrofe entre o direito de manifestação previsto na constituição assim como o direito de ir e vir também previsto na carta magna.
Minha opinião é que precisamos parar de apoiar esse tipo de manifestação que tranca ruas e rodovias, comprometendo a circulação de pessoas e bens. Apoiar movimentos assim é como apoiar manifestações violentas, quebra-quebra e etc,
Há muitas formas de se manifestar pacificamente a contrariedade com alguma coisa ou situação. Sejamos criativos!
Portal do Trânsito – Por fim, quais são as possíveis consequências para o Brasil como um todo se o bloqueio de rodovias perdurar pelos próximos dias?
Rochane Ponzi – Já se conhece os riscos, pois o que motivou a criação do art. 253-A do CTB foram as consequências advindas da primeira greve dos caminhoneiros ocorrida lá em 2015 (Vide a MP 699/2015 que deu origem à Lei 13.281/16).
Se as estradas são o nosso principal meio de transporte de bens, mantidos os bloqueios podemos vir a ter novamente crise de desabastecimento.
Precisamos olhar para esse problema de forma desapaixonada, mirando apenas a questão técnica. Não obstante os posicionamentos políticos, a verdade é que se o órgão competente com circunscrição sobre a via deixar de autuar quem se enquadra no art. 253-A, pode vir a incorrer em crime de prevaricação (art. 319 do Código Penal).